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segunda-feira, 14 de maio de 2007

Contos Contíguos – capítulo II – Uma lição


Design for Destino – 1947 - Salvador Dali
A história de Berto é cheia de entreveros amorosos. Sempre um homem de caráter forte atraiu desde muito moço muitas garotas e mulheres. Seu jeito desligado era um componente que lhe dava uma ponta de charme. Além disso, lidava com as relações humanas de modo racional, o que a priori seria um motivo de distanciamento das pessoas por alguma razão as aproximava. Apaixonar-se ou gostar das meninas era platônico, na maioria das vezes. Forte e ao mesmo tempo sem entrega. Aliás, nascera como uma couraça que o impedia de ir a fundo em qualquer que fosse o relacionamento. Isso se traduzia como um fator enlouquecedor para o sexo oposto. Elas queriam ter o domínio sobre aquele homem, mas ele escorregava. De tanto ouvir comentários a respeito disso, decidiu, ressabiado, analisar a situação. Segundo as mocinhas esse era o fator principal para não engatar um namoro. Ainda desconfiado e um pouco inseguro começou a se soltar e finalmente teve sua primeira – real - namorada. Ainda pisando em ovos, foi se abrindo e mostrando seu verdadeiro eu. Aquele que parecia impossível de se atingir, finalmente deu os primeiros passos ao coração. Entregou-se perdidamente àquela mulher. Morria de amores e ciúmes. Alguns pensamentos o consumiam. Vivia o céu quando junto dela e o inferno longe. Na verdade nem sempre era assim. No decorrer de seu relacionamento, Berto que era inocente, mas inteligente percebia que algumas atitudes daquela pequena eram no mínimo estranhas. Pressentia de alguma forma, e o levavam, mesmo que de maneira inconsciente, a crer que características levianas estavam abrigadas nela. No entanto, mesmo não estando cego de amores, lhe doía o fato de pensar em não mais tê-la. O sexo era ótimo, aliás, anos depois percebeu que nada de tão excepcional havia no ato.

A vontade de estar com ela e também até a simples razão de saber que alguém se importava com ele já justificava o relacionamento. Era um garoto ainda, tateava pelo mundo dos romances, nada sabia da vida e muito tinha a perder. Embora jovem, já trabalhava. Na pequena mercearia ganhava o sustento para suas badalações e ainda lhe sobrava muito. Dinheiro que não se recusava a gastar com presentes para sua linda cortejada. Aos poucos, ela, que, apesar de mais amadurecida, era um ano mais jovem, via seu poder sobre o pobre mancebo passou a se aproveitar de situações insinuando esse ou aquele desejo material. O jovem a cobria de mimos, estava, coitado, caído. O curioso nisso tudo é que mesmo que houvesse tido relações sexuais anteriores, a cópula o prendia de uma forma indecifrável.

Com o avançar dos meses de convivência, começou-se a constatar alguns fatos que antes eram só fruto de sua imaginação ou de, uma sensibilidade apurada. Certa vez numa boate, se deu conta que a namorada trocava olhares com outrem. Pego-a num relance e frente ao desconcerto dela teve certeza. Foram embora do local e ele contrariado brigou, mas fez o pior não determinou o fim do relacionamento. Sua relação, ficou clara, era de dependência. Amolecendo nesse momento, perdeu-se muito em respeito próprio e mais ainda em segurança. Ficou inseguro.

Dava-lhe tudo fazia suas vontades e tinha um fogo absurdo, até mesmo para idade. Quando o assunto era transar não deixava em branco. Ficou preocupado, não sabia o que estava errado no namoro. Então, investiu então mais naquela mulher, comprou jóias caras com as economias que tinha e tentou segurá-la de todas as formas. Mas o erro não estava nele. Depois de tanto se magoar e viver às voltas com imagens de traição que lhe atormentavam, um fato deu novo contorno a sua situação. Não fora um flagrante, mas a certeza de que uma mentira o transportava ao óbvio.

Certa vez, quando visitou a amada em sua casa, deparou-se com uma roupa dependurada numa cadeira com características muito similares, para não dizer quase idênticas as que havia visto, por acaso no dia anterior em uma menina. Nessa ocasião chegou a confundi-la com a namorada, mas pela distância fora impossível ter certeza. A então garota havia entrado em um prédio residencial em um local longínquo da casa da namorada. Não deu muita atenção e descartou a hipótese, afinal o que ela poderia estar fazendo lá? Sabia que podia ser só impressão, pois estava muito distante e poderia ser só alguém parecido, ficou com medo dessa percepção, achou que estava perdendo as estribeiras. Além disso, outra coisa que se anunciava contra é que no horário de sua visão ela deveria estar num curso em outro canto da cidade.

Mas, a dúvida lhe encafifou, decidiu então ao enxergar a roupa na cadeira perguntar como tinha sido o curso, ela teve uns segundos de desconcerto. Mentiu. Já com medo de alguma desconfiança escondeu com o pé as pequenas meias vermelhas da véspera, espalhadas por cima do tênis. Ele notou o movimento. Foi o começo do ponto final. Agora tinha certeza. Ela havia sido infiel. Voltou para casa com vontade de chorar. Mesmo assim a deixara como se nada tinha acontecido. Pensou, pensou e se preparou para a idéia de deixá-la. No dia seguinte a hipótese, mais clara, do término já estava viva na sua mente. Ligou para ela, combinaram de se encontrar e foi direto ao assunto: não a queria mais. Caminhou um pouco e depois virou olhando para ver se ela tinha alguma reação de choro. Nada aconteceu. Soube muito tempo depois que aquela traidora chorou por três dias. Mas àquela altura, seu coração mesmo muito doído não admitia retorno. Foi sua primeira lição como homem.

Um comentário:

Anônimo disse...

Esse seu conto muito bem escrito diga-se de passagem, serve de análise sobre à causa de tornar-nos mentirosos. A mentira nasce de outra e se instala qdo há sofrimento. E, pior ainda, qdo propagasse em novas vítimas inocentes, destruindo-lhes os sonhos e às crenças no altruísmo hummano. Qdo por fim, não os transforma à pó-de-trapo e o arrasta bueiro abaixo. Assim, lamentavelmente aconteceu comigo,e, espero de coração que não seja eu o algoz daqui pra frente.